Golpe contra advogados

Na semana passada, meu escritório recebeu a ligação de um suposto turmeiro – pessoa responsável pelo recrutamento de profissionais e encaminhamento para contratação por empresas de grande porte – afirmando ter obtido nosso contato através de um site jurídico em que possuo cadastro, sustentando que precisava de um escritório de advocacia de São Paulo/SP, para distribuição de 720 ações trabalhistas.

De acordo com o intermediário, referidos trabalhadores haviam sido demitidos de 3 (três) empresas do ramo da construção civil e não teriam recebido o pagamento de suas verbas rescisórias.

Alegando objetivar o recebimento de uma comissão de R$ 100,00 (cem reais) por contrato assinado, o intermediário teria negociado com os trabalhadores demitidos o pagamento de 1 salário mínimo – hoje apurando em R$ 880,00 (oitocentos de oitenta reais) – relativos a adiantamento dos honorários de um profissional de São Paulo.

O intermediário já tinha tudo pronto e planejado!

No primeiro dia do contato telefônico, uma 3ª feira, foi sugerido pelo golpista que nos dirigíssemos à cidade de Colombo, no Paraná, para assinatura dos contratos e procurações.

No segundo dia, na 4ª feira, nos foi informado de que um colega, também turmeiro, havia acabado de receber mais 400 empregados demitidos. Para que também atendêssemos a referido público, deveríamos nos apressar para ir à cidade já na 6ª feira daquela semana, uma vez que o suposto colega estava em tratativa com outros escritórios de advocacia de São Paulo.

Nos foi sugerido, então, o aluguel de um salão por ele indicado, com capacidade de recepção para 400 a 600 pessoas, para realização das entrevista e assinatura da documentação relativa ao processo. A diária do mencionado espaço era de R$ 780,00 (setecentos e oitenta reais), valor este já negociado com o intermediador. Nos foi sugerido a permanência na cidade por 3 dias.

Teríamos de arcar, ainda, com o deslocamento dos trabalhadores até o salão, que nos renderia o aluguel de alguns ônibus pelo valor total de R$ 10.000,00 (dez mil reais), além de despesas variadas com impressão de toda a documentação, hospedagem, alimentação, etc.

Tais despesas seriam pagas ao final das entrevistas, no último dia de hospedagem, após o recebimento dos honorários pagos pelos trabalhadores, agora clientes, com exceção do salão, que deveria ser por nós reservado, mediante pagamento antecipado, à vista.

Já desconfiando de que tal “prêmio de loteria” poderia ser um golpe e, após o intermediador ter informado acerca das quantias que nosso escritório teria de investir para a realização da mencionada captação de clientes, decidimos por realizar uma pesquisa mais detalhada sobre o golpista e a proposta que nos estava sendo apresentada.

Embora o nome e CPF fornecidos por ele fossem verdadeiros, não exclui-se a possibilidade de tratar-se de um laranja. Questionado acerca de um telefone fixo para que pudéssemos contatá-lo, nos foi dito que não possuía. O endereço fornecido também não confere, tratando-se de uma rua de terra, onde a numeração de um lado refere-se ao muro de uma escola e, do outro, ao muro de uma casa residencial qualquer.

Da mesma forma ocorreu com o tal salão indicado para recepção dos trabalhadores dispensados. Ao pesquisar o endereço na internet, não localizamos nenhum buffet ou salão de eventos. Também nos foi negado o fornecimento de um número fixo para contato, afirmando, ainda, não possuírem nenhum canal de comunicação/divulgação virtual do espaço.

Ao pesquisar sobre golpes na internet, localizamos diversas denúncias formalizadas pelas OAB’s dos mais variados Estados, acerca de situações bastante semelhantes à vivenciada por nosso escritório.

Em maio deste ano, uma advogada do Rio de Janeiro[1] sofreu a mesma tentativa de golpe que nosso escritório. Inclusive, a pessoa utilizou o mesmo nome para identificar-se: Sr. José de Oliveira. Naquela ocasião, o golpista informou ser ex-funcionário da empreiteira Odebrecht. Segundo o suposto ex-funcionário, ele e outros 400 operários haviam sido demitidos há cerca de 3 meses, sem terem recebido qualquer tipo de rescisão, e retornaram para a cidade de origem, Cachoeiro de Itapemirim, no Espírito Santo. A proposta era contratar um escritório do Rio de Janeiro para ingressar com uma ação coletiva na Justiça do Trabalho.

A façanha somente foi descoberta pois, o golpista apenas forneceu uma conta para transferência bancária de R$ 400,00 (quatrocentos reais) - valor de aluguel do espaço escolhido por José para a reunião – sem, contudo, informar o nome do titular e CPF do correntista. Desconfiada, a advogada pesquisou a localidade da agência e descobriu que se tratava de uma unidade da Caixa Econômica Federal no Estado do Paraná e não do Espírito Santo conforme havia relatado o possível cliente.

Para o nosso escritório, a estratégia já foi mais rebuscada. Nos foi fornecido o nome completo, CPF e dados bancários de titularidade de Thiago Palmeira – provável laranja ou possível parceiro do golpista.

Objetivando prevenir que outros colegas se deparem com tal situação, decidimos por tornar pública a experiência que passamos.

Embora o ramo de atuação e valores sofram mudanças, a essência do golpe é a mesma. Se imaginarmos que 10 escritórios de advocacia são contatados e, realizam o depósito prévio de, supomos, R$ 1.000,00 (hum mil reais) a título de adiantamento ou de aluguel do mencionado salão – como foi o nosso caso, o golpista terá em sua conta, ao final do dia, R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Em 2011, a OAB São Paulo[2] divulgou a ocorrência de golpes similares, assim como a OAB Sergipe[3], que registrou em 2015 ocorrência referente a uma tentativa de golpe também originária da cidade de Colombo, no Paraná.

Em junho deste ano, a OAB Campinas[4] publicou em seu site matéria sobre o “Golpe da Cana”, explicando que há cerca de 3 anos esse mesmo golpe foi aplicado em São Jose do Rio Preto e no Distrito Federal, em nome de trabalhadores da indústria da cana. Nos casos apurados, o homem desaparece logo após receber o depósito bancário de R$ 1.200,00 (hum mil e duzentos reais), para as despesas iniciais com a reserva de um salão para atendimento dos reclamantes.

Nosso escritório comunicou o caso às Prerrogativas das OAB São Paulo e OAB Paraná, juntamente com uma pesquisa de nome, CPF, telefones celulares e endereços fornecidos pelos golpistas, assim como os dados bancários por eles fornecidos, para tentar auxiliar na realização das investigações. Também formalizamos Boletim de Ocorrência perante uma das Delegacias de São Paulo/SP.

No Paraná, contudo, não foi possível realizar registro da ocorrência, uma vez que faz-se necessário o comparecimento pessoal da vítima a um dos postos Policiais da Cidade, não sendo possível, portanto, a lavratura de Boletim de Ocorrência de forma eletrônica.

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[1] http://www.oabrj.org.br/noticia/98798-oabrj-alerta-advogados-sobre-risco-de-golpe-contra-escritorios

[2] http://www.oabsp.org.br/noticias/2011/10/05/7314

[3] http://oab-se.jusbrasil.com.br/noticias/242607843/oab-se-alerta-sobre-golpe-contra-escritorios-de-ad...

[4] http://oabcampinas.org.br/site/oab-campinas-alerta-sobre-golpe-contra-advogados-trabalhistas/